Parentes queridos parentes

O que são parentes? Como surgem? São importantes? O que nos acrescentam? É sobre essas questões que me proponho a pensar e falar mais do que qualquer coisa. Não que outras coisas não sejam importantes.

5 de set. de 2010

“...Eu quase que nada sei. Mas desconfio de muita coisa” Riobaldo

Sou uma leitora contumaz. Leio de tudo um tanto. Mas alguns livros espero o momento certo para me encontrar com eles. Como sei quais serão esses livros? Por já ter ouvido falar, ter lido citações, resenhas, comentários e até menções sarcásticas ou não. Todos vão para uma lista dentro de mim e lá ficam até que surja a oportunidade. Dessa lista existe desde Ana Karênina, Pais e Filhos, passando por MobyDick e Trabalhadores do Mar até Grande Sertão: Veredas. São os que chamo de grandes livros. Grandes por serem clássicos, ou seja, o molde do modelo dos que vieram a posteriori; grandes por serem de letras miúdas em muitas paginas; grandes por serem importantes. Sei lá se estão ou não na lista disso ou daquilo. O que me importa é que estão na minha lista. Do começo do ano para cá li sete dos Grandes Livros e estou lendo o oitavo. De todos, o que mais informações tinha era sobre esse sétimo, mas ainda não tinha me proposto a ler completamente. Trata-se do Grande Sertão: Veredas de João Guimarães Rosa. E já sei que será um livro para ser lido com prazer mais de uma vez. No decorrer da leitura diversas vezes compararei leitores de São Paulo (adolescentes) e de Minas gerais tomando contato com esse livro. Meu Deus, como deve ser difícil entender para uns e fácil para outros. É necessário convivência com palavras, expressões, com a música, com as pausas para entendê-lo. Quem tem pressa não degusta. Hoje sei que um livro desse na mão de um adolescente deve ser um desperdício. Tenho uma amiga, Valeria, professora, que certa vez pediu para que os alunos lessem Sagarana. As reclamações eram muitas. Até que ela decidiu ler com o tal ritmo e eles começaram a apreciar. Nessa época tinha uma estagiaria na classe chamada Magna. De onde era a Magna? De Cordisburgo, terra de Guimarães. Cidade que inteligentemente sabe de cor e salteado os textos dele. Valeria pediu para Magna ler um conto. Ah, gente! Eu tive a oportunidade de assistir algo único. Magna com sua voz cantante de mineira começou a ler ou melhor começou a pegar os meninos pelas pernas e a levá-los para um mundo especial. Mesmo o aluno mais renitente foi ficando serio, calado, mergulhado no tema. Uma das passagens mais fascinantes foi ao ler sobre boi indo embora, ao inclinar o corpo para o lado entre duas fileiras de carteiras com um olhar de quem acompanha o animal, triste caminhando lento e os alunos acompanharam seu olhar e a história com o encantamento de quem registra a ferro e fogo uma passagem. Eu estava sentada na última carteira e os vi seguindo o boi e talvez tenha sido um dos momentos mais bonitos e pungentes de uma aula de verdade. Um dia vou para Cordisburgo. Por enquanto estou lendo Grande Sertão: Veredas. É de fácil leitura? Não. Não é. No entanto fica fácil quando você se deixa levar pela prosa. Um das coisas que mais gosto de fazer é conversar. Não só com meus conhecidos, mas especialmente com desconhecidos. A prosa é mais lenta, mais degustada, mais sentida principalmente com as pessoas simples. Um dia, sentada na escada de pedra lá na Fazenda puxando um dedo de prosa com seu Zé Pinheiro e ele me falou uma das frases mais marcantes que já ouvi: Ah, minha filha,“quem tem horta não deve couve” e Seu Dito nunca ficou devendo. Fiquei com tanto orgulho de nosso avô. Por que me lembrei desse fato? Por que o livro nada mais é do que uma grande prosa cheio de verdades e saberes que só o povo simples e vivido sabe dizer.

3 comentários:

  1. Wania, sabe que estou em pedaço da minha vida que nem desconfiando eu estou mais???
    Que dirá "saber".
    Alias saber eu nunca soube e nem tive pretensão de saber.
    Mas vamos lendo, quem sabe algum dia essa leitura sirva de alguma coisa, não é messss?

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  2. "...Eu queria decifrar as coisas que são importantes...." porque ..."Vivendo , se aprende ; mas o que se aprende , mais , é só a fazer outras maiores perguntas..."
    Fala a verdade, Waninha! Tem sabedoria maior?
    Riobaldo é sábio....
    Só quem pôde ter um dedinho de prosa com o Zé Pinheiro consegue entender que é possível filosofar sobre o mundo e sobre a humanidade sem deixar o seu pequeno pedaço de chão e, assim compreender, os aforismos de Gimarães Rosa.
    Boa leitura!
    beijos

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  3. Como é bom ver alguém fazer algo com paixão!!
    Não existe coisa melhor que você vender sue trabalho com amor e dedicação...Só um professor apaixonado pelo que faz consegue prender a atenção de um monte de adolescentes. Deve ter sido uma aula e tanto.
    E uma história de mineiro não tem preço...
    O Wander passou o final de semana conosco na praia e lembrou de qdo era criança que ele ficava conversando em um local que se consertava TV em Paraiso, chegou lá um mineito, com a Tv no ombro, dentro de um saco e disse, qdo o técnico quis saber qual o problema..."já faz dias que ela num proseia, nem tem feição"...muito bom!!!
    bjs a todos

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