Parentes queridos parentes

O que são parentes? Como surgem? São importantes? O que nos acrescentam? É sobre essas questões que me proponho a pensar e falar mais do que qualquer coisa. Não que outras coisas não sejam importantes.

21 de ago. de 2009

Com a palavra, Rosely Sayão.

Gosto muito de várias coisas que Rosely Sayão, psicóloga e escritora, nos fala. Sua coluna das quintas-feiras na Folha Equilibrio (anexo da F. São Paulo) na maioria das vezes me deixa feliz. Primeiro por que é bom ler algo que nos auxilia em nossas reflexões, em segundo por que na maioria das vezes compactuo com suas afirmações. A dessa semana tem como título "Família Sustentável" onde li algo emocionante: " Se os pais não transmitem suas tradições e as de suas famílias de origem aos filhos -estimulando o contato entre eles, contando suas histórias, comparecendo aos rituais existentes-, criam uma geração órfã de família. É como se a existência do sobrenome não fizesse sentido, pois não há diferenciação nem características próprias do grupo familiar.
É preciso lembrar que família e sociedade são agrupamentos interdependentes: se um vai mal, o outro também vai. (...)"

Esse blog nasceu com essa intenção e fico muito feliz ao ver que estamos no caminho certo.

Hoje gostaria de falar um tiquinho sobre uma pessoa por quem nutro grande amor fraterno: Klecius. Foi e é um dos primos mais doce dos que tenho. Como todo mortal tem defeitos mas tem inúmeras qualidades também.

Acredito que tenha sido o primo mais próximo de mim durante minha adolescência. Nunca me escondeu nada, ao contrário, talvez tenha sido a pessoa que mais me informou e explicou os "segredos da vida". Não me sentia envergonhada com ele.

Um dia se deparou comigo com os olhos estatelados diante de uma revistinha que encontrei na casa da cidade da vovó: "Que foi Waninha?" Não me lembro de ter respondido pois estava perplexa diante das imagens incomuns para quem iniciava adolescência. Ele, correndo atrás de outros primos (para fazerem sei lá o que, pois estavam sempre correndo) é quem parou quando me viu estancada com a "tar" revista que encontrei no porão da casa. Não estava conseguindo entender nada.

Com aquele jeitão de quem na maior parte das vezes vê o que a maioria não vê, parou e me fez a pergunta acima. Recordo-me dos chamados aos berros dos outros primos: "Vamos, Klecius", mas não se abalou. Se aproximou e me perguntou se podia ver o que estava olhando.

Entreguei a revista e, confesso que minhas lembranças estão um tanto embaralhadas nesse momento, mas me recordo dele falando: "Olha, isso tem uma explicação. Se quiser, depois explico para você, tá? Agora eu tenho de ir com eles e vou levar a revista. Prometo explicar quando voltar." Olhei para ele tentando imaginar o que ele teria para explicar e lá se foi correndo pelo quintal da vó.

Quando voltou me procurou e perguntou se podíamos sentar lá fora para conversar e lá, no quintal, começou a falar, falar, falar na tentativa de tirar minhas dúvidas; de vez em quando mostrava a revistinha e dizia que não era para me preocupar e que aquelas revistinhas nem valiam a pena. Não me lembro de suas palavras ao certo, no entanto, lembro-me perfeitamente que pôs um ponto final em minha perplexidade como prometera. Aliás, a sensação que guardei era a de que se o Klecinhos falou é por que não haveria nenhum problema!
Curiosa essa nossa empatia. Nunca falei ou questionei o fato dele gostar de beber mas sempre me preocupei. Não queria ver as consequências daquilo 'nunquinha' pois seria muito doloroso. O Klecinhos gosta de dançar, tem ritmo, é leve e sabe nos conduzir com segurança. Era gostoso dançar com ele. E graças aos bons céus , pude sentir isso em dois ou três passos no salão durante o casamento do Weber. É brincalhão, sabe jogar futebol, sabe nadar, brincar com crianças e olhar quem está só. É companmheiro para comprar pão, para desatolar e empurrar carros, queimar a perna em canos de escapamentos de Kombis, dá bons conselhos assim como boas gargalhadas. É trabalhador e adora pratos exóticos. Capaz de acordar 3 horas da manhã para levar meu pai para comer uma iguaria as 4 horas no mercado e por aí vai. Seria capaz de escrever um rol de qualidades desse rapaz. Era um anfitrião perfeito para meus pais, fato que comentavam sempre e hoje, minha mãe ainda o faz.
No dia 16 de julho de 1974, estávamos sentados próximos a imensa churrasqueira feita para as bodas de ouro de nossos avós e conversávamos sobre qualquer coisa. Ele estava triste, muito triste com alguns episódios vividos, porém não os mencionava de jeito nenhum. Também, cá entre nós, não era necessário, afinal eu os tinha vivido também. Repentinamente, com um copo na mão abaixou-se e pegou no chão misturado a terra, uma moeda de um centavo (não sei se de cruzeiro ou cruzado e isso não é importante) e me disse que gostaria de marcar aquele momento com um símbolo por mais insignificante que aquele pudesse aparentar. Na verdade hoje penso que foi um dos presentes mais valiosos que recebi pois estava carregado de carinho, de fraternidade, de cumplicidade nos maus momentos e de compreensão sem necessidade de palavras. Guardei a moeda e está comigo até hoje e assim permanecerá.

Na última vez que estive na Bahia, começo de maio, mamãe repentinamente falou-me: " Minha filha, estou preocupada com o Klecius, ele está triste. Não está bem." Na mosca! Eu tinha ficado conversando com ele e me contou sobre o acidente envolvendo 4 jovens que haviam morrido. Foi o primeiro a ser avisado. Eram pessoas conhecidas, filhos de gente próxima e que a única coisa que queria era impedir que Karyna, sua filha, sofresse quando soubesse, daí o fato de ter impedido que ela fosse acordada; era importante que acordasse naturalmente para depois entrar em contato com coisa tão dolorosa; no entanto, infelizmente, não conseguiu impedir que isso acontecesse. Sabia que seria um dia longo, muito longo para ela e estava muito chateado...

Contei isso para minha mãe, mas ela não estava convicta de que fosse só isso. Só sei dizer que uma semana depois ele teve um problema grave cardíaco e cerebral. Ficava pensando no quanto aquela família iria passar. No quanto ele iriam sofrer com crises de abstinência, entre outras coisas.

Temia seu conhecimento farmacológico, afinal se há algo que entende é de remédios, certo? Puxa, como ele deve ter ficado chato, grosso, sem paciência, irritadiço, teimoso. etc. e tal, assim como ficou meu amado quando enfartou e ficou insuportável por não fumar feito uma caipora. Minha vontade era de jogá-lo fora no lixo, como diz Sandra de Sá.

Não gostaria de saber que ele não esta cumprindo com o que os médicos pediram... Que não esteja andando... Que não esteja levando uma vida, agora, mais saudável.

Se, continuar sendo o Klecinho doce, carinhoso, afetuoso e de palavra deverá, sem dúvida, estar se cuidando com o zelo necessário pois sabe que há muita música para ser dançada ainda.

Juízo moço da moedinha, viu?

4 comentários:

  1. Katya : Presente!
    Bom dia meu povo lindo deste Brasil varonil!
    Boa dica de leitura, Wania Cristina! Não é à toa que ando grudada na sua "aba". Vivo adquirindo cultura atráves de osmose.
    E como uma boa dica vale ouro, fui.. fui.. fui...e cheguei aqui ó : http://blogdaroselysayao.blog.uol.com.br/
    Estou sorvendo palavras sábias.
    Sobre o meu irmão, você como sempre, sabe descrever com muita galhardia o ser humano, e não seria diferente com ele.
    Obrigada por oferecer a minha/nossa família tamanho carinho.

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  2. Minha lembrança do Klecius é sempre de um sorriso nos lábios, dos cabelos encaracolados, dos olhos espertos.
    Mas tudo isso era o que se via! É necessário lembrar do que se sentia. Você, Waninha, escreveu tudo o que podíamos perceber, que podíamos encontrar e que depois de tanto tempo ainda sabemos que está lá.
    Klecius, queremos você pronto para muitas voltas no salão do clube, ao som do Cassino de Sevilha.

    beijos

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  3. Minhas presentes primas.
    Observaram as músicas/momentos?
    beijinhos

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  4. Amada prima,
    Você bem sabe que momentos que estas músicas trazem à minha memória, não? Mas não deixam de ser "momentos"!

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